terça-feira, 29 de novembro de 2016

Política, media, redes sociais e os cegos ( III)

 Era assim que dantes as pessoas  comuns escreviam no espaço consignado aos leitores dos jornais:

Exmo Sr Director

Deixe-me começar  esta humílisima  epístola por felicitar o jornal que V.Exa. superiormente  dirige. Que Deus lhe dê muitos e bons anos nessa hercúlea  e gloriosa tarefa.
O assunto que me leva a incomodar V.Exa ,  e a partilhá-lo com os seus leitores, é o seguinte : na minha rua existe há seis meses uma canalização rota que blá blá blá..... traz grades incómodos  aomoradores blá blá .................


Agradeço, penhorado, a atenção de V.Exa,
Anastácio Velinha

Bem antes de a maré twitter virar ( das primaveras árabes para o Trump), as caixas de comentários dos jornais online já eram  o  alvo : lixo, baixaria, vazadouro, não se admite, fechem essa gaita etc.
 Temos, portanto, que o problema não é uma técnica  específica, ( o twitter é diferente das caixas de comentários dos jornais) , mas a titularidade  de um novo espaço comunicacional.


Podemos falar  de ampliação, ou de ligação directa, mas também podemos usar o conceito que  Manchev aplica à  condição sobre-estética: uma totalização privativa. Significa isto um campo sensível capaz de reagir a todos os estimulos, o sonho de Fukuyama , no qual o lifestyle se sobrepõe às velhas identificações  colectivas, políticas, que organizavam o mundo. Manchev considera isto  um snobismo  em que  a vida fica reduzida  a uma mercadoria através  de modos de  troca, produção  e controlo, que  impõem reacções imediatas a estímulos estéticos que, por sua vez,geram mais reacções  Um campo animal, um sentido aistético, já não da arte, mas, neste caso, da comunicação.

Simplificando, a opinião política aberta a todos, em tempo real e sem mediação das velhas elites é o sonho , sim, mas não o de Fukuyama: o dos anarquistas. Zizek, pelo seu lado, já desdenha  dos Indignados  espanhóis e dos manifestantes gregos: 


As pessoas, coitadas:



segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Talvez

Está pronto o que pode ser mais um livro. Não, não é o manual de autodestruição. É sobre mulheres, as que morrem que nem tordos. Se sempre houver edição dou-vos notícia.

sábado, 26 de novembro de 2016

Política, media, redes sociais e os cegos ( II)

Leiam isto. Lembram-se das primaveras árabes? Vejam como o mesmo jornal falava de uma rede social em 2011. O que mudou? Até um morto responde. Aliás , só um morto pode jsutificar que baste  um Trump para mudar toda uma teoria  sobre redes sociais.
A autora é muito clara na sua confusão:

Em vez disso — e tal como acontece com todas as tecnologias — as redes sociais são ferramentas que podem enriquecer os processos democráticos, pois ajudam a dar voz aos que não a têm, mas que, por outro, são uma plataforma excelente para os populistas disseminarem a sua mensagem de forma muito eficaz. A lua-de-mel das redes sociais acabou.

A confusão assenta na categorização moral de uma tecnologia. Ao endeusamento segue-se  a reprimenda. Aqui já nem interessa que o motivo seja o de sempre ( elegeram um tipo de quem os departamentos universitários não gostam), antes a própria categorização.

A expressão popular, no lavadouro municipal ou  no twitter,  não é um valor moral em si. A tecnologia que amplia essa expressão também não pode, logicamente, constituir uma categoria moral. 

( cont)

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

O cu e as calças

SIC-N, antes das 20.00h. José Pedro Tavares, enviado à Turquia. Depois de reconhecer os milhares  de prisões de jornalistas (colegas dele) , advogados, professores etc, termina comentando a resolução do PE sobre a Turquia: isto vem numa altura em que a  Europa vive uma onda ( penso que foi esta a expressão)  de xenofobia e islamofobia.
 A única onda que a Europa tem tido é de ataques letais e ajuda a refugiados ( pese a Hungria) , mas devia bastar a prisão e perseguição  psicóticas de jornalistas colegas dele. Nada chega para esta gente.

Nauseabundo

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Política, media, redes sociais e os cegos ( I)

Toda a  mudança tecnológica implica transformação social. Isto é uma lei de bronze que, quando ensinava psicologia social, desafiava os meus alunos a contrariar. O prémio era de 500 euros. É delicioso que tanto politólogo, colunista , sociólogo e analista só tenham isto para dizer sobre política e redes sociais: "É uma vergonha, pá".
 É delicioso, mas não nos deve espantar. Quando alguém justifica a ascenção de um político através de eleições, há sempre o coro dos  distraídos: "Hitler também chegou ao poder através de eleições em 1933". Por acaso não houve eleições  nenhumas em 1933, por acaso o partido nazi perdeu votos e lugares em 1932, por acaso foi nomeado  porque  alguns amedrontaram-se  e porque a alta finança alemã queria ordem nos vermelhos. Seja como seja, a palavra  do povo é uma estucha...

O essencialismo reside na representação que, em cada época ou lugar , o poder de nomear  desenha. Tem o poder da palavra, de dizer como as coisas são.
Em Cuba não são necessárias eleições porque toda a gente ( o PC cubano) sabe o que o povo quer. Lassale era ainda  mais pragmático nos seus conselhos a Bismarck:  as massas querem é recompensas materiai: dê-me o sufrágio universal e eu dou-lhe um milhão de votos.


Se nada disto é novo, como é possível o estupor diante do efeito das redes sociais? Como é possível o ar compungido com que se queixam de agora toda  a gente ter opinião sobre assuntos complexos? Claro que  problema não é o homem  da rua agora ter opinião nem sequer  o de poder exprimi-la. É poder ter e exprimir em condições de recepção iguais aos dos dono da representação. Vai ficar cada vez mais difícil ser cubano.

( cont.)