terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Crónicas do Planeta Oval: Começou o Seis Nações

E logo com um bang: Gales-Inglaterra, na sexta passada. Vitória difícil dos visitantes por 21-16, contra todas as previsões. Os galeses, a jogar diante do seu indefectível público e com todas as suas estrelas, eram favoritos, mas foi a equipa da rosa que mostrou os espinhos, apesar da onda de lesões, de uma linha de três-quartos inédita e de um asa fechado (Haskell) de recurso. Enfim, é uma maneira de dizer. O veterano 6 fez o jogo da sua vida e foi um dos responsáveis pela recuperação dos ingleses, que perdiam ao intervalo. Com a inestimável ajuda de Robshaw e Vunipola, placou todas as camisolas vermelhas que lhe apareceram pela frente, menos as 80 mil das bancadas, e só não marcou um grande ensaio porque foi parado pelo poste, por Faletau e por Cuthbert, que aliás teve de impedir a saída da bola do ruck, a meio metro da linha, para não levar cinco pontos. Uma falta feia e punida com cartão amarelo e penalidade em frente aos postes (convertida por Ford, outra grande exibição que possivelmente lhe valeu a camisola 10 até ao Mundial). Ben Youngs também fez uma bela joga, o que terá resolvido a dor de cabeça dos médios a Lancaster. E quantos aos centros, a outra grande dor de cabeça? A dupla Burrell-Joseph estava longe de ser óbvia, e talvez ceda o lugar a Barritt e Tuilagi quando estes voltarem das respectivas lesões, mas ninguém deu por nada. Pelo contrário. Joseph marcou um ensaio delicioso, escapando como uma enguia aos três-quartos galeses (a esta hora, North ainda deve estar no Millenium Stadium à procura do segundo-centro do Bath) e Burrell, sem grandes rasgos, que ninguém pedia nem esperava, soube travar as investidas do temível Jamie Roberts. Para ajudar à festa, o ponta Watson, presença intermitente no XV de Lancaster, marcou um ensaio depois de uma mais que intereressante jogada colectiva. Ah, e a Inglaterra impôs-se claramente nas fases estáticas. Se o domínio na mêlée não foi  uma surpresa, tal é a qualidade de opções na primeira linha, já a também inédita segunda linha (Kruis, estreia internacional, e Atwood, tradicional suplente de Lawes, Lanchbury e até Parling) deu conta do recado. Do lado de Gales, salvou-se o ensaio de Rhys Webb, um formação que joga sempre bem à volta da mêlée, depois de magnífica arrancada de Faletau, um dos melhores, e mais subestimados, 8s do mundo. Em resumo, a rosa venceu e convenceu. Com o extra spice de que estes dois velhos rivais voltarão a encontrar-se em Setembro, no grupo da morte do Mundial, onde estão metidos com a Austrália. Um grande ficará pelo caminho e os bifes, a jogar em casa, partem em vantagem. Entretanto, ninguém duvida que deram também um passo bem maior do que a distância entre Cardiff e Londres rumo à conquista do Seis Nações. Atenção: nada está decidido e têm de ir a Dublin a 1 de Março, no que será provavelmente o tira-teimas do torneio. Mas se continuam a jogar assim, os que, como eu, prevêem a dobradinha da Irlanda, actual campeã, vão ter que lhes tirar o chapéu...
E por falar em Irlanda, não se pode dizer que o primeiro jogo tenha sido entusiasmante: vitória em Roma por 26-3, cumprindo os mínimos. Mas ganharam. Em sua defesa, diga-se que jogaram sem Sexton, o habitual maestro, e com uma terceira linha pouco rodada, embora Tommy O`Donnel (a substituir Sean O´Brien, que se lesionou no aquecimento depois de meses de recuperação, imagine-se) tenha marcado um ensaio de encher o olho. Outro galo cantará no sábado, quando receberem a França. Mas o calendário é-lhes favorável: recebem os dois vencedores da primeira jornada e enfrentam fora os derrotados. E têm sempre Conor Murray, marcador do outro ensaio e em grande forma no tandem de médios. A esperança é verde.
Até porque a França deixou uma pálida impressão na vitória de 15-8 sobre os escoceses. Em Paris, foram os celtas a marcar o único ensaio e os anfitriões só ganharam à custa de uma mão-cheia de penalidades do promissor abertura Camille Lopez. Ao que isto chegou: os montanheiros a fazer correr os jacobinos... A boa notícia é que a equipa de Saint-André parece ter encontrado finalmente um chutador de jeito. Fraco consolo, porque tarda em encontrar o rugby champagne de outras eras. Há quem aponte o dedo ao dinheiro fácil da televisão que corre pelo campeonato gaulês, levando dirigentes míopes a importar três-quartos do lado de lá do equador (sinal dos tempos, o arriére que jogou pelos bleus no sábado era sul-africano de nascimento) e à asfixia de jovens talentos nacionais no Top 14. Uma conversa semelhante à da invasão de brasileiros para desculpar os maus resultados do nosso futebol. Mas a verdade, nada clara e distinta, é que Monsieur insiste em confiar a camisola 13 a Bastareaud (que saudades de Sella...), um cepo capaz de fixar dois defesas - magrinhos, bien sur, ou tão lentos como ele - e de enterrar a equipa sempre que a cabeçorra faz o esforço de pedir aos presuntos uma troca de direcção ou às manápulas um passe para alguém que saiba distinguir filet mignon e rosbife. Dá para nome de série: Reviver o Passado na Linha Maginot. E o que dói mais é que os frogs têm ao lado de tal guilhotina (não muito) móvel o melhor centro do hemisfério norte, Fofana, um desperdício de pura classe atirado ao lixo da história como  la grandeur de la France em Waterloo. No sábado, vou comemorar com Guinness a coça que vão levar, ohlala!

5 comentários:

  1. Obrigado pela excelente cronica. Uma pequena correcao, o ensaio de Gales foi marcado por Rhys Webb, o Dwayne Peel ainda joga, mas nao desta vez.

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  2. Ao melhor estilo Cordeiro do Vale! Ah, que saudades de ver rugby na TV!
    R. F.

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  3. Obrigado, tem toda a razão. É um lapsus linguae de velho: pensei no actual e, sem querer, escrevi o antigo.

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  4. Caro Pedro

    Agradeço a pormenorizada descrição: posso "dispensar" a sport TV até ás vésperas do mundias:
    Um Abraço

    vasco silveira

    PS: agradeço desde já, a continuação das crónicas .

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  5. Hão-de continuar, mas não dispense a Sport Tv. Nada como the real thing.

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