quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

O regresso da história

Um bom teste para avaliar a qualidade de uma ideia é confrontá-la com a passagem do tempo, esse grande escultor. Das duas grandes ideias que agitaram os anos 90, o "choque das civilizações" de Huntington e o "fim da história" de Fukuyama, a segunda tem vindo a ser regularmente contrariada pelos factos desde o 11 de Setembro. Depois da queda do Muro e da morte anunciada do socialismo, Fukuyama previa a vitória definitiva da democracia liberal e da economia de mercado por falta de comparência do adversário. Mas o que vemos hoje, por todo o lado, é diferente. A Rússia trocou uma ditadura hard por uma soft (com eleições, mas sem alternativa ao czarismo de Putin) e continua a ser uma pesada sombra sobre todos os países à sua volta. A China não dá quaisquer sinais de abertura política e mostrou que se pode ter crescimento económico sem liberalização. A Coreia do Norte mantém-se irredutível no papel absurdo de relíquia comunista e ameaça nuclear. O socialismo e a pobreza progrediram na América do Sul (Venezuela e não só). A Primavera Árabe mergulhou o Médio Oriente no caos. Até na Europa o terrorismo e os extremismos de direita e de esquerda ameaçam as democracias. Como sempre, é um erro confundir os nossos desejos com a realidade. Um erro que tem consequências práticas. Talvez o vilipendiado Huntington tenha razão, afinal: a civilização ocidental continua em luta. E nada nos diz que o seu triunfo esteja escrito nas estrelas.

28 comentários:

  1. Já o Dr. Freud dizia que a distância entre o princípio do prazer (os nossos desejos) e o princípio da realidade é por vezes incomensurável. O tempo, esse grande escultor, dará razão a alguns: resta saber quem serão esses alguns.
    Raquel

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  2. "Mas o que vemos hoje, por todo o lado, é diferente. A Rússia trocou uma ditadura hard por uma soft (com eleições, mas sem alternativa ao czarismo de Putin) "

    Com isto talvez se entenda que a ameaça à democracia na Europa vem de alguns que se dizem democratas, nomeadamente daqueles que têm insistido anos a fio que não há alternativa às políticas seguidas na Europa - há eleições mas alternativa dizem que não há. É a ditadura soft de que fala para a Rússia.

    João.

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  3. O que ameaça a democracia é tanta gente a passar dificuldades económicas pela Europa fora e a consequente falta de acesso, já não digo a um nível digno de consumo, mas a serviços essenciais como educação e saúde (há relatos suficientes por aí, não preciso de colocar links). Essa é a luta que a Civilização Ocidental tem de travar. Na minha modesta opinião. O Syriza (não sei se é esse o exemplo de extrema esquerda que ameaça a democracia de que o Pedro fala), por exemplo, está apenas a tentar dar mais dignidade ao povo que agora governa, com uma coisa tão simples como dar um pouco de mais rendimento a quem tem pouco, para pagar a electricidade a quem precisa de se aquecer. Medidas de emergência, para já, que não podem esperar por resultados de negociações. Perceber uma coisa tão básica é, isto sim, sinal de civilização e foi o que motivou a construção da Europa do pós-guerra. Ou seja, perceber isto, vale por meia dúzia de Huntingtons. Isso é radicalismo? Pois, se calhar é. Foi essa espécie de radicalismo que fundou a Europa e não faltam exemplos de discursos radicais nesse sentido dos seus fundadores, que fariam empalidecer o discurso do Tsipras.
    Portanto, é preciso perceber de que lado está o radicalismo e inclusive o que é o radicalismo. Quem estiver mesmo atento ao que se passa nos últimos dias, vai reparar que há muito boa gente do lado do mercado (opinion makers, think tanks, etc), espantados com a intransigência, não da Europa, mas dos burocratas das instituições europeias (não confundir) e de alguns governantes. Há anos que ouço muita gente a protestar contra a imposição de tamanhos para os jaquinzinhos, proibição de colheres de pau, frioleiras dessas, por parte de Bruxelas e Estrasburgo, taxando essas medidas de imbecis e radicais. Ora, já agora, se faz favor, as mesmas pessoas digam agora também alguma coisa sobre a imposição e manutenção de regras que sacrificam uma geração de pessoas (não de jaquinzinhos) em nome de um eventual futuro de prosperidade das gerações seguintes. A não ser que já achem isso tudo muito razoável.

    caramelo

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    1. Pois..o paradoxo da 'laterelização' do "radicalismo" de que se fala tem talvez a ver com aquela dissonância reiterada - "Marx acertou, a História é que se enganou"... Mas se calhar não tem nada a ver, que sei eu?

      Jorg

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    2. Hã? O Jorg fala muito complicado, parece um filósofo francês. Isto é simples. Aqui vai mais uma achega para aquilo que dizia antes:
      No dia em que o ministro das finanças grego propôs uma outra forma de pagamento da dívida, trocando-a por obrigações perpétuas e obrigações indexadas ao crescimento, o mercado ficou otimista e as bolsas subiram. Age o BCE e fala o ministro das finanças alemão, arrefecem as bolsas. Já por aqui os nossos suaves liberais, e demais cinicos avulsos, podem ver o que é que os mercados acham radical (no sentido idiota de radical). Não estou a ver nenhum investidor ou credor esclarecido que ache que fica satisfeito matando ou amputando o devedor. Sei de economia o suficiente para saber isto. Se não for suficiente e a coisa continuar confusa, ler aqui em baixo, alguém com algum conhecimento de mercado, mandando um recado à Alemanha para ter juízo, enfim, para se deixar de radicalismos idiotas:
      http://uk.reuters.com/article/2015/02/03/uk-eurozone-greece-boe-idUKKBN0L714X20150203

      caramelo

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    3. Considere ainda isto, jorg. Considere por um momento que as medidas a tomar não são punitivas e que, por este motivo, não faz sentido agora falar em culpa. Deixemos isso, que o senhor Deus um dia os punirá a todos como bem entender. Considere que enquanto todos estão vivos, compete aos civis dar-lhes condições para viver e que as medidas a serem tomadas devem ir nesse sentido. Mas vamos de outra forma: Considere que está a governar uma dúzia de catraios feios e ranhosos e mal-educados, que têm passado o tempo a gastar quanto dinheiro lhes deu em chupa chupas. Castiga-os retirando-lhes o pão, obrigando-os a trabalhar primeiro para lhe pagar na totalidade o que gastaram? Retire daqui agora a parte ética, considere só a racionalidade económica. Seria inteligente não lhes dar pelo menos um naco de pão todos os dias para terem forças para lhe pagar a dívida? Morriam ao fim de uma semana e ficava a arder com o dinheirinho. Aviso que gosto do meu cinismo temperado com um pouco de humor negro.

      caramelo

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    4. O Syriza tem um programa radical, mas (como já disse aqui) acredito que não o vai cumprir. Ou seja, o seu radicalismo tenderá a diluir-se no choque com a realidade. O que me parece mais interessante, do ponto de vista intelectual, é que o aparente triunfo do liberalismo sobre o qual construímos o Ocidente esteja a colocar no poder partidos programaticamente antiliberais. Dá que pensar.

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    5. caramelo, muito me enterneci com o seu apuradíssimo apelo e evocação ao interesse esclarecido, dos credores, claro está!! Os bons, preclaros e prudentes credores rejubilam em converter os seus créditos em créditos sem prazo a benefício do devedor (obrigações indexadas ao crescimento....e excedentes orçamentais, é melhor ler em grego - note, meu caro, que pode bem ocorrer crescimento económico sem excedentes orçamentais), e assim manter o devedor vivo!! Uns filantropos interessados persuadidos pelo humanismo mais edificante!! Mas que os velhacos, misantropos irracionais e impassivos, se não compadecem!! Mesquinhos que se ocupam da contabilidade dos seus excedentes de trigo ante a fome que desgraça tantos irmãos, primos e outros conhecidos e muitos desconhecidos por esse mundo fora!!

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    6. Pedro, o Syriza não tem um programa radical. A não ser que considere radicalismo dar alguma qualidade de vida aos seus cidadãos. Mas volto a dizer que foi com esse radicalismo que construimos o ocidente. A nossa atual civilização foi construida com um misto de liberalismo e intervenção do estado, ao nível da regulação e de estado social, combatendo resistências (sim, desde o inicio desta nossa etapa que se ouve que entrámos em decadência por causa da excessida intervenção do estado na economia).
      É claro que isto exige produção de riqueza. Mas não sei se conhece a realidade grega, em particular. Centenas de milhares de familias mal têm dinheiro para pagar as necessidades mais básicas. É esta realidade que é radical. As primeiras medidas do governo, ao nível interno, foram emergenciais, para tentar corrigir esta situação.
      Sobre o programa antiliberal, ainda não retirou qualquer conclusão do facto de ser precisamente o Mercado e grande parte dos analistas do mercado, que não disfarçam a sua irritação com as recentes medidas do BCE e dos governos mais intransigentes, como a Alemanha. Veja o movimento das bolsas e leia os artigos. É uma questão de bom senso, algo que constitui também um pilar da construção do Ocidente.
      Ainda quanto ao radicalismo do Syriza, este tomou de facto algumas medidas que vão no sentido de cortar radicalmente com algumas tradições da sociedade grega, como a excessiva ligação à Igreja Ortodoxa (ainda a religião oficial do estado), começando com medidas simbólicas como o juramento dos governantes pela sua honra, dispensando a benção da Igreja, sem deixar, no entanto, de dar essa opção a quem queria, pelo que não estamos exatamente perante o partido bolchevique. Também com a xenofobia e nacionalismo, tão enraizados na sociedade grega, inclusive na Igreja (estamos a falar dos Balcãs). Nesta matéria, uma das primeiras medidas foi dar aos filhos de imigrantes a nacionalidade grega, um projecto que se arrastava há muito pelo poder na Grécia, com muita resistência dos partidos tradicionais, o que prova também a natureza puramente estratégica e conjuntural da aliança entre o Siryza e o ANEL. Portanto, quando se equipara a extrema esquerda e a extrema direita na Grécia, o Syriza e o Aurora Dourada (não confundir, apesar de tudo, como ANEL), é preciso saber-se muito bem do que estamos a falar e não meter tudo no mesmo saco.
      Pois claro que o Syriza não vai cumprir tudo (nenhum governo cumpre). Mas eu espero que cumpra o mais que puder e que o ajudem. Eu tomo partido.

      caramelo

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    7. O Syriza não tem um programa radical? A nacionalização da banca e dos hospitais privados, a saída da NATO, etc., não são propostas radicais?

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  4. Usando uma escala de tempo grande vemos que as ideias que temos na UE são indiscitivelmente as ganhadoras em todo o mundo. Na UE os apegados a crenças são quase só tantos como os não crentes.

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  5. Sim, Pedro, a civilização ocidental continua em luta — mas, no plano interno, digamos que tem multiplicado os esforços no combate às liberdades e direitos democráticos sempre que estes parecem aos seus dirigentes cada vez menos responsabilizáveis obstáculos ao primado da economia governante; e, no plano internacional, digamos, para parafrasear Kundera, que a civilização ocidental, através dos seus governantes, se tem comportado regularmente como "o mais brilhante aliado dos seus próprios coveiros". E, assim, digam as estrelas o que disserem, os "valores europeus" — da "arena do sentido" no coração da cidade (Eduardo Lourenço) à cidadania activa e respponsável e ao uso público da razão através do "fio de linho da palavra" (Sophia), etc., etc. — tendem a tornar-se cada vez mais decorativos e residuais.

    Abraço

    msp

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    1. Não me parece. O Ocidente ainda é aquela partezinha do mundo onde o fio de linho da palavra não se limita a ser decorativo. Outra coisa é se as nossas sociedades estão a caminhar para uma democracia mais activa e responsável, para usar o fio de linho das suas palavras. E aqui tenho muiuto mais dúvidas, talvez por razões diferentes das suas. Obviamente que alguma coisa está a correr muito mal quando temos taxas de abstenção de 50% e o nível de desconfiança nos políticos é o que se sabe.

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    2. Mas o Tocqueville, como bem sabe, há muito que previu isto. Talvez um certo grau de anomia ou alienação seja congénito à democracia, uma espécie de preço a pagar pela liberdade.

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    3. Caro Pedro, eu tembém penso que, apesar de tudo, há nas sociedades europeias um legado único pelo qual vale a pena combater e aceitar,se quiser, a "luta de morte". O problema aqui é que a defesa desses valores incarnados ainda em múltiplos aspectos e dimensões da vida das sociedades europeias se faz, só se pode fazer, dando-lhes prioridade, e não subordinando-os ao seu contrário. A filosofia e a democracia, pois que é disso que se trata — ou seja, a exigência de dar conta e razão no diálogo da alma consigo própria e na deliberação e decisão comuns, por um lado, e, por outro, a participação igualitária no governo da cidade como garantia da limitação e do exercício justo do poder — só se defendem e "estendem" através do seu investimento e exercício instituintes: omeadamente, contra o primado da economia, através da sua subordinação arquitectónica (política) enquanto meio de uma vida boa cujos critérios permanecem abertos a uma interrogação permanente. E o facto de Tocqueville ter previsto a possibilidade da auto-destruição da liberdade e o de outros terem também compreendido que não há lei, constituição ou fórmulas institucionais que, fora da actividade instituinte ou do exercício efectivamente governante da cidadania, não pode significar que a erosão da democracia ou o desinvestimento do seu projecto sejam, não uma ameaça à liberdade, mas o "preço a pagar pela liberade". É por isso que não vejo defesa e extensão da democracia que não passe pela repolitização explícita e democrática da direcção ou governo de uma economia que devolva aos cidadãos as responsabilidades e direitos políticos que lhes permitam, governando-a, ordenar e subordinar democraticamente a mesma economia. Suponho que a propósito desta questão tenhamos perspectivas e propostas diferentes, mas, do meu ponto de vista, é aqui que o ponto bate, ou (quase) todos os pontos acabam por bater.

      msp

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    4. Sim, temos aqui perspectivas diferentes. Não me agrada, confesso, a ideia de uma repolitização da economia, se isso significa uma estatização ou mesmo uma socialização da economia. O mercado livre é isso mesmo: livre. Livre não significa, claro, fora da lei ou do bem comum, mas também não significa ao serviço da ideologia de turno. Enfim, está a dar-me ideias que tenho que parofundar. É por isso que gosto de conversar consigo. Voltarei ao tema.

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    5. Pedro, também eu gosto de discutir consigo por razões semelhantes às que V. invoca. Voltaremos decerto a trocar ideias sobre tudo isto. Mas, para já, apenas uma observação sobre o mercado. Não me parece que uma sociedade complexa possa ou (desejavelmente) deva funcionar sem mercado e sem dinheiro. A questão que levanto é antes a da democratização do mercado e do conjunto da actividade económica (na medida em que esta governa efectivamente, ainda que no registo da denegação, a vida da cidade, subalternizando ou esvaziando as suas instâncias políticas explícitas). De facto, o mercado é sempre instituído e regulado politicamente (institucionalmente) e até mesmo quando se lhe atribui a regulação superior de outros aspectos da vida social, isso é feito por disposições e imposições institucionais que lhe são exteriores ou preliminares. Assim, por exemplo, um mercado democratizado não só é compatível com como parece exigir a exclusão do seu âmbito — o tratamento como mercadoria — da força de trabalho, do mesmo modo que exclui, sem dúvida, a estatização ou recrutamento e gestão estatais dessa mesma força. Depois, há igualmente bens inapropriáveis (pelo menos sem deterioração ou destruição pura e simples) sob a forma de bens de consumo individual que será necessário excluir do mercado — e o acesso e o gozo desses bens deverão ser regulados na esfera pública, por um poder político efectivamente exercido pelos cidadãos e cujo desenvolvimento será inversamente proporcional ao do "poder do Estado" (assente este, como o Pedro sabe, na distinção estrutural e permanente entre governantes e governados, nos antípodas do que o exercício da cidadania significava para o nosso mestre Aristóteles). Em relação com estes problemas (são só exemplos), embora distinta, temos a questão da democratização da política de salários e rendimentos. Uma vez que, segundo os melhores economistas de meados do século passado, é absolutamente impossível a imputação individual do contributo das pessoas para a produção de riqueza e para as condições que a permitem e favorecem a "produtividade", teremos de definir critérios que não sejam o acaso ou as posições adquiridas que assegurem um máximo, ou até mínimo, de justiça nesse plano. Enfim, não quis mais do que sugerir que(não) podemos estar descansados, pois é muito e fundamental o que teremos de ir debatendo. Suponho que, pelo menos, estaremos de acordo, na maioria dos casos, sobre a importância e a premência de questões como aquelas a que acabo de aludir. O que já não é pouco — para começar.

      Cordial abraço

      msp

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    6. "A questão que levanto é antes a da democratização do mercado e do conjunto da actividade económica, na medida em que esta governa efectivamente, ainda que no registo da denegação, a vida da cidade"
      .
      A afirmação anterior de que é difícil imaginar uma sociedade complexa sem dinheiro ou mercado, acaba por se posta em causa por uma afirmação deste tipo. Sendo o mercado o local onde livremente os participantes trocam mercadorias, no que constituiria a sua "democratização" senão numa perturbação grosseira e destruição prática. É ajustado afirmar que os mercados podem ser mais ou menos eficientes, transparentes ou regulados, mas "importar" para a sua esfera um conceito elaborado para expressão política maioritária, só pode criar confusão conceptual. Uma intenção política expressa democraticamente não necessita de perturbar o mercado pois dispõe, por definição, ao contrario do que afirma sobre a suposta inevitabilidade da captura da política pelo economia, do poder regulatório de determinar onde ele mercado deve existir, ou não, além de toda a panóplia de instrumentos distributivos e outros funções coercivas do estado. Porque é importante ser claro numa matéria destas? Porque, todos sabemos, que a função reservada ao mercado é marcador de primeira linha sobre que tipo de sociedade se defende.

      XisPto

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    7. A livre troca de mercadorias, a "soberania do consumidor", etc. não são incompatíveis com a democratização dos salários e rendimentos que é, a meu ver, condição da democratização do mercado — sendo a exigência desta uma consequência necessária para quem a política — e sobretudo a política democrática — prima sobre a economia, pondo-a no seu lugar, digamos assim, de "intendência". O mesmo primado ou prioridade da democracia requer que o trabalho, a participação na actividade económica ou na produção da eiqueza, dado o lugar enorme e determinante que desempenha moldando a vida do cidadão comum, não seja uma mercadoria. No entanto, é verdade que a função reservada ao mercado — do mesmo modo que a divisão institucional do "trabalho"político" ou do acesso à participação no exercício do poder político (a não confundir com o "poder do Estado" — "é marcador de primeira linha sobre que tipo de sociedade se defende".

      msp

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  6. Todos os representantes do governo, a começar por deputados e comentadores, começam qualquer debate sobre a questão da dívida com uma defesa acérrima dos credores.

    Reparem se se lembrarem. Não falha.

    Falam sempre pelo interesse do credor, falam sempre a partir da posição doss direito do credor, nunca tomam uma posição que se pareça minimamente contrária ao credor.

    Reparem.

    Nunca vi nada assim em lado nenhum do mundo. Nem a Alemana teve vergonha do Nazismo quando foi para pedir um corte de mais de 50% da dívida de guerra que aliás lhe foi dado (Londres 1953).

    João.

    PS: Já agora, acho que a história ainda não voltou. Talvez volte mais depressa pela crise Ucrânia-UE-EUA vs Rússia do que pela questão grega - acho que nem que o Podemos ganhe na Espanha e a FN na França a história regressa.

    A UE é uma velha alemã.


    João.

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  7. O Syriza a nível económico não tem programa - é o sumo espremido desta semana.
    Ganharam uma gravata italiana (as sedas da Florença do Matteo são, 'preggiate' desde que não venham do Mercado de S. Lorenzo, que é mais de coiros), dos Brits uns encorajamentos para cravanços á Sra. Merkel, do Juncker umas bjks e serem levados para uma audiência por uma mão dada.
    Na conferência com Schäuble foi demasiado fácil ver quem é que, despojada a retórica e a novidade da pose, não andava ali a vender água sem caneco.
    E foi uma pena, e sabe porquê - porque a Sra. Merkel, mesmo ido contra muito do seu eleitorado, e o SPD até se empenham - muito mais do que transparece no maniqueísmo da treta onde se demoniza a Alemanha - em ajudar de forma sustentada e substancial. Como mostram os seus anos de Chanceler, nem é ideologicamente dogmática - acusam-na de 'roubar' ideias seja ao SPD, seja aos Verdes - pelo que se o Sr. Varoufakis substanciasse alguma da sua retorica anti-Oligarquias e indicasse como financeiramente a sua responsabilidade fosse para além de andar a pedir dinheiro de outros, até iria ter alguma coisa para mostrar aos seus eleitores.
    Ao contrário do que os mídia recitam, o mais importante da conferência de imprensa foi quando Schäuble refere ""Verlässlichkeit ist die Voraussetzung für Vertrauen" - (livremente traduzido, a fiabildadel é pré-requisito para confiança"). No entanto essa fiabilidade não se constroi com paleio tipo conversa do 44, e.g. “O facto de ter dificuldades de liquidez num certo período (...) não significa que não tivesse um horizonte financeiro, (...), compatível com o meu nível de despesas”"

    Assim acabou-se com pelo paleio do Sr. Tsipras a dizer no Parlamento que não queria mais ordens por e-mail. Ontem teve a manif d'apoio - o que funciona contra ele, pois é ´demasiado fácil invocar este 'Benchmark' para calibrar as manfs futuras.
    O 'Deja vu' lembra aquele título de jornal - o FMI já não vem!.

    Jorg

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    1. "O Syriza a nível económico não tem programa - é o sumo espremido desta semana."

      O jorg já descobriu isso tudo em uma semana; deve ter alguma nanny cam (qu'é por causa do nanny state) no conselho de ministros do governo grego.

      João.

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  8. Podem falar dos princípios que quiserem, mas há um que é incontornável: na política internacional não se humilha nem se sufoca impunemente um povo. Um génio que nos serve de ministro de economia disse, do alto dos seus dois centímetros de altura, que se Portugal pagou, a Grécia também tem de pagar. A malta que gosta do seu Tocqueville, podia pelo menos aprender dele e da sua época algo mais que as máximas que abrilhantam os almanaques. Houve um tempo na América em que um povo se revoltou e, inclusive, foi buscar apoio ao inimigo fidagal do opressor, a França. Questões meramente fiscais, nada de mais, as regrazinhas. Mas lá acharam os nativos que estava ameaçada a sua honra de homens livres e queriam respirar um pouco. Ora, se a Grécia, que para além de ter perdido grande parte da sua soberania, vive mal e ainda por cima é tratada como uma tribo suja distante, for empurrada para ir procurar apoio à Rússia (para além da China), resta-vos sacar do vosso tocqueville e fustigar esses europeus bastardos com meia dúzia de frases sobre liberalismo. Fazemos depois um concurso de name droping e umas flores de retórica plateresca com o Jorg.

    caramelo

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  9. O programa de governo do Syriza inclui a nacionalização da banca, a saída da Nato e a nacionalização dos hospitais privados? Bem, Pedro, nada disto, insisto, bate certo com o eu tenho lido de analistas que não escrevem exatamente no Bandeira Vermelha. Não tenho visto esse receio, pelo contrário, muitos têm elogiado o bom senso do ministro das finanças e do tsipras e reconhecido o seu esforço, em oposição à intransigência (sim, radicalismo) do governo alemão e do BCE (Portugal, que se tem posto em bicos de pés, não conta, como se sabe). Leu o artigo do Joska Fisher, por exemplo? Mas eu dizer isto ou nada, é a mesma coisa.
    Mas, voltando ao tal programa, o Syriza já negou pelo menos os dois primeiros, não sei do terceiro, Mas não pense que não sei o que quer dizer: o Syriza sempre teve esse discurso de extrema esquerda e muitos dos seus membros ainda pensam assim. Acontece que foi eleito com um programa mais moderado e que a sua maior preocupação neste momento é sobretudo melhorar as condições de vida do seu povo. Não lhe interessa nada, nem está nas suas prioridades, entrar em conflito com a Nato, nem lhe interessa afastar o investimento (apenas que os seus armadores paguem impostos, se não se importam). A percepção que aqui ainda se tem do Tsipras, não é exatamente a mesma que têm aqueles que pela Europa fora têm contactado com ele. Não acho muito razoável concluir tão rapidamente que o Syriza é um bando de lunáticos. É como a percepção que muitos ainda têm de que os gregos são um povo de pastores montanheses que produzem azeite, iogurte e queijo. Ou marinheiros e armadores de navios. E querem todos sair do euro e são todos contra a união europeia. O que eu mais tenho lido por aí, é “se querem sair do euro, saiam de vez”. Não adianta nada o Syriza ou a grande maioria dos gregos dizerem um milhão de vezes que não.
    Concluindo, sobre o programa do novo governo grego, vou esperar pela sua divulgação oficial, após aprovação do parlamento. Se as expetativas de formação de uma nova albânia sairem goradas, resta manter a esperança e ter paciência. Eles ainda la vão estar algum tempo.

    caramelo

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